(relator:  Oliveira Abreu) O  Supremo Tribunal de Justiça veio considerar que «o acidente de viação não é uma estática mas uma dinâmica, daí que os factos adquiridos devam ser interpretados numa perspetiva critica para se apurar, selecionar, surpreender aqueles que tiveram a virtualidade de, só por si, desencadearem todo o nexo causal e necessário ao evento. A lei distingue, no campo mais geral da responsabilidade extracontratual, entre responsabilidade civil por factos ilícitos e responsabilidade pelo risco. A responsabilidade por factos ilícitos, com base na culpa, é a regra, pois só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei. O elemento básico da responsabilidade é o facto do agente – um facto dominável ou controlável pela vontade, um comportamento ou uma forma de conduta humana – pois só quanto a factos dessa índole tem cabimento a ideia da ilicitude, o requisito da culpa e a obrigação de reparar o dano nos termos em que a lei a impõe (…). Quando não se encontra fundamento no instituto da responsabilidade civil extracontratual ou aquiliana, afastada que está a culpa do condutor do veículo interveniente no acidente ajuizado, cabe aferir se a obrigação de indemnizar se fundamenta em facto danoso gerador de responsabilidade objetiva, porque incluído na zona de riscos a cargo de pessoa diferente do lesado. Nota dominante da responsabilidade pelo risco, temo-la no facto de a lei prescindir daquele elemento subjetivo, da culpa. O fundamento da responsabilidade não reside agora no propósito de um acto culposo, mas sim no controle de um risco, ou talvez, com maior rigor, no controle de potenciais danos, aliado ao princípio da justiça distributiva, segundo a qual quem tiver o lucro ou em todo o caso, o beneficio de uma certa coisa, deve suportar os correspondentes encargos – ubi commodum ibi incommodum. Tradicionalmente, (…) entendia-se que não era legalmente admissível o concurso do risco do lesante com a culpa do lesado, invocando, para o efeito o regime jurídico decorrente do nº 2 do artigo 570º do Código Civil, sendo que actualmente está firmada no Supremo Tribunal de Justiça uma interpretação não mecânica do artigo 505º do Código Civil no sentido de que não implica “uma impossibilidade, absoluta e automática, de concorrência entre a culpa do lesado (ou, mais amplamente, a imputação do acidente ao lesado) e os riscos do veículo causador do acidente, de modo a que qualquer grau de contribuição causal ou percentagem de culpa do lesado inviabilize sempre, de forma automática, a eventual imputação de responsabilidade pelo risco, independentemente da dimensão e intensidade dos concretos riscos de circulação da viatura. Porém, tal não implica que, por si só e de forma imediata, se responsabilize o detentor efetivo do veículo (e respetiva seguradora) pelos danos sofridos pelo lesado, implicando sim que, em função da factualidade subjacente a cada caso concreto, se pondere a medida da contribuição do lesado, culposa ou não culposa. Quando se alude a acidente imputável ao próprio lesado, quer-se dizer, antes de mais nada, acidente devido a facto culposo do lesado, acidente causado pela conduta censurável do lesado, importando saber se os danos verificados no acidente devem ser juridicamente considerados, não como um efeito do risco próprio do veículo, mas sim como uma consequência do facto praticado pelo lesado.  Quando se apure que o acidente ocorreu devido à atuação da lesada – que o causou – sem que se possa atribuir ao condutor do veículo (à culpa do condutor) ou aos riscos próprios do veículo qualquer contribuição na respetiva produção, esta circunstância encerra causa excludente da responsabilidade objetiva do condutor ou proprietário do veículo».

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