(Relator: João Pedro Pereira Cardoso) O Tribunal da Relação do Porto veio considerar que «ao administrador de uma sociedade, só por essa razão, não incumbe sem mais agir no sentido de assegurar que os veículos ao seu serviço circulassem de forma segura, e para tanto acautelar a correta manutenção preventiva da viatura, da qual faria parte a supervisão e substituição das peças em causa, ação que seria adequada a evitar a produção do resultado típico – a morte da vítima. Entre os deveres de garantia atinentes ao funcionamento da empresa, contam-se os de cuidar de que as instalações e todo o equipamento do estabelecimento cumpram as normas sobre segurança; alertar para a perigosidade das instalações e da atividade desenvolvida, sobretudo quando não sejam evidentes, mediante a colocação de avisos e condicionamento de acesso aos lugares perigosos; impedir ou condicionar a atividade dos seus trabalhadores que ponham em perigo os próprios trabalhadores ou terceiros, mediante a utilização de medidas de cautela adequadas aos riscos acrescidos; e evitar o uso de substâncias venenosas e bem assim a utilização de veículos e equipamentos da empresa contrariamente às normas regulamentares e prudenciais. Mas, se a aplicação deste critério não oferece dificuldade em pequenas empresas, maior dificuldade oferece no quadro de estruturas empresariais complexas, dotadas de hierarquia e divisão, onde as tarefas se encontram funcionalizadas e divididas por setores ou departamentos específicos e especializados, como é o caso dos autos. Não é por ter certas obrigações funcionais estatutárias que o dirigente passa automaticamente a ser garante, nem da qualidade de garante decorre a exigibilidade pessoal de um qualquer dever. torna-se necessário indagar se estava nas competências específicas e nas capacidades fácticas de cada um dos garantes o cumprimento do dever em causa. Assim, para que possa ser imputado um facto a um superior hierárquico, diretor ou administrador, ao julgador cabe determinar os seus deveres funcionais ou o quadro de competências como modo de delimitar o seu espaço individual de responsabilidade aferir da possibilidade de, no cumprimento desses deveres, o superior hierárquico dominar ou controlar os riscos proibidos criados (por exemplo) pelo trabalhador. No caso em apreço, a referência geral à qualidade do arguido na organização da atividade da empresa, vista a divisão do trabalho por várias pessoas, nada nos diz sobre a existência ou não do concreto dever funcional de garante por parte do seu administrador em matéria de planeamento, execução e fiscalização da manutenção, reparação e inspeção das viaturas, tarefas que naturalmente se incluem na gestão corrente da empresa».

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