(relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza): A instaurou uma ação contra a Clínica X e contra B, pedindo a sua condenação solidária no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais. Para tanto, alegou que tinha sido submetida, em 10 de outubro de 2008, a uma cirurgia de extração de um dente do siso incluso, da qual resultaram dores, limitações, incapacidade para o trabalho, para o treino físico e para a progressão na carreira militar, causadas por lesões resultantes da falta de cuidado do segundo réu, C, na realização da referida extração, cuja possibilidade de ocorrência não lhe havia sido comunicada. Os réus contestaram, alegando que a autora foi informada sobre o diagnóstico e procedimentos adequados ao caso e sobre os potenciais riscos da extração, a qual foi realizada segundo as leges artis. Mais referem que algumas das sequelas invocadas não podem resultar do tipo de intervenção em questão. O Tribunal de 1ª instância julgou a ação improcedente, considerando que as lesões sofridas não são uma sequela do ato cirúrgico, antes decorrendo dos riscos próprios da ciência médica. Em sede de recurso, o Tribunal da Relação de Lisboa concedeu provimento parcial à apelação, condenando os réus ao pagamento de uma indemnização. Para tanto, sustentou que, apesar de estar provado que os procedimentos cirúrgicos foram realizados de acordo com as leges artis, a autora foi “atingida na sua integridade física, sofrendo sequelas que não haviam sido contratadas, para cuja ocorrência não havia consentimento e de cuja possibilidade (…) não havia sido informada”, quando a seriedade das consequências e a taxa de frequência com que podem ocorrer impunham que em relação a elas tivesse sido cumprido um dever de esclarecimento, que foi violado. Considerou, portanto, que havia violação de um dos deveres contratuais: o dever de prestar informação a fim de obter do paciente o consentimento informado, “dever esse que também é imposto por lei e protege os direitos absolutos da integridade físico-psíquica e da liberdade de vontade”. Os réus recorrem, então, para o Supremo Tribunal de Justiça, alegando que entre a não prestação de informação sobre os riscos inerentes à cirurgia e os danos que a autora sofreu, provocados por circunstâncias anormais ou anómalas, não se verifica um nexo de causalidade adequada. Confrontado com a questão, o STJ entendeu que, de facto, o réu médico estava obrigado, por lei e pelo contrato, a informar a autora do risco de lesão do nervo lingual e das implicações de um eventual, e que tal dever foi violado. A lesão veio efetivamente a verificar-se. O coletivo de juízes sublinhou, ainda, que a cirurgia não foi realizada em situação de urgência, tendo sido agendada com tempo suficiente para a autora ponderar as vantagens e os riscos da extração. Posto isto, embora não se possa afirmar que, naturalisticamente, a falta de informação tenha provocado a lesão do nervo lingual direito e demais danos, e mesmo não se tendo demonstrado que, se conhecesse o risco que a intervenção implicava, a autora não teria consentido na sua realização, o STJ entende que é possível responsabilizar os autores. Repare-se que, de acordo com o entendimento do coletivo de juízes, se se tivesse conseguido provar que, munida da informação completa, a autora não se tinha submetido à intervenção, poder-se-ia ter estabelecido uma “cadeia naturalística de causas”, podendo-se afirmar a causalidade. Não se tendo conseguido realizar tal prova, o STJ entendeu que a perspetiva jurídica que se afigura correta é “a de determinar se deve ser ressarcido o concreto dano consistente na perda da oportunidade de decidir correr o risco da lesão do nervo e das suas consequências; perda de oportunidade que, em si mesma, é um dano causado pela falta de informação devida, em abstrato suscetível de ser indemnizado, e cuja proteção tem como sustentação material o direito à integridade física e ao livre desenvolvimento da personalidade (…). No seu conteúdo inclui-se, nomeadamente, o poder do titular de decidir em que agressões à sua integridade física consente, assim afastando a ilicitude das intervenções consentidas (…)”. Mais continua o acórdão, referindo que, “nesta perspetiva, está ostensivamente demonstrado o concreto nexo de causalidade naturalístico (…); e preenchido o requisito da causalidade adequada (…)”. O Supremo Tribunal de Justiça autonomiza, a este propósito, o dano da perda de oportunidade para efeitos indemnizatórios.
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