(Relatora: Ana Margarida Leite) O Tribunal da Relação de Évora considerou que «a responsabilidade civil por ato médico pode basear-se não apenas na má prática médica por violação das leges artis, mas também na falta de consentimento informado por parte do paciente, ainda que não se tenha por verificada a existência de erro médico. O consentimento do paciente configura uma condição da licitude de qualquer intervenção médica, designadamente cirurgia, que configura uma ingerência na integridade física; tal consentimento não é válido, entre outras situações, se o paciente não estiver na posse da informação relevante, cabendo ao médico o dever de esclarecimento prévio do doente. Assiste ao paciente o direito a que lhe seja prestada, pelo médico, a informação relevante que o habilite a consentir em consciência, conforme expressão constante do artigo 19.º, n.º 2, do EOM, o que visa assegurar a autonomia e a autodeterminação do doente, no âmbito da decisão de se submeter ou não à intervenção proposta pelo médico, sendo inválido o consentimento, entre outras situações elencadas no artigo 20.º, n.º 1, daquele estatuto, se o doente, no momento em que o presta, não estiver na posse da informação relevante. Estando em causa a opção entre dois tratamentos, um conservador e o outro cirúrgico, para a fratura do úmero sofrida pela autora, ainda que o tratamento conservador lhe causasse incómodos vários e que tal a tenha levado a consultar o médico 2.º réu, comunicando-lhe as dificuldades sentidas, tal não o dispensava de lhe prestar esclarecimento sobre os aspetos relevantes da intervenção a realizar, designadamente sobre os respetivos riscos, entre eles o risco específico de lesão do nervo radial no decurso do procedimento cirúrgico. Tratando-se do risco de uma lesão cujo período expectável de recuperação varia entre 3 e 12 meses e que se mostra idónea a comprometeu a mobilidade do membro superior afetado, existindo a opção por um tratamento conservador, era exigível ao médico 2.º réu que informasse a autora da possibilidade de a cirurgia lhe provocar a lesão do nervo radial e que lhe desse a conhecer as consequências previsíveis de tal lesão, de forma a habilitá-la a optar conscientemente pelo tipo de tratamento que tivesse por adequado, decidindo se pretendia ou não realizar a cirurgia, assumindo os riscos inerentes a tal tratamento. Configurando o consentimento, livre e esclarecido, prestado pelo paciente, uma causa de exclusão da ilicitude da intervenção médica, face às regras de distribuição do ónus da prova estabelecidas no artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil, compete ao médico o ónus da prova do facto impeditivo do direito invocado pela paciente. Não decorrendo da factualidade provada que o médico 2.º réu, ou outrem, tenha informado a autora do risco de lesão do nervo radial inerente ao tratamento cirúrgico, nem que a lesada tenha demonstrado estar ciente de tal risco e ter conhecimentos que lhe permitissem avaliar devidamente as respetivas consequências, mostra-se inválido o consentimento prestado pela paciente, que se limitou a assinar a documentação que lhe foi apresentada, sem qualquer esclarecimento prévio».