(Relatora: Fátima Reis Silva) O Tribunal da Relação do Lisboa veio considerar que «a relação entre o intermediário financeiro e o cliente é obrigacional, pois o cliente (credor) tem o direito de exigir ao intermediário financeiro (devedor) a realização de uma prestação proveniente da sua atividade de intermediação financeira – gera-se uma relação obrigacional complexa e duradoura, iniciada nas negociações de um primeiro contrato e desenvolvida continuamente por subsequentes e repetidas ou renovadas operações de negócios firmadas pelas partes. No âmbito de responsabilidade contratual derivada da relação estabelecida entre o A., como cliente, e uma instituição bancária, enquanto intermediário financeiro, a regra do artigo 500º do CC, prevista para a responsabilidade extracontratual, não é aplicável, antes o sendo a regra do artigo 800º, nº1 do CC. Nestes casos, o intermediário financeiro responde diretamente pelos seus atos. Não estando o tribunal vinculado pela jurisprudência uniformizada no AUJ nº 8/2022, literalmente não aplicável, dado o teor dos artigos 7.º, nº 1, 312º nº 1, alínea a), e 314º do Código dos Valores Mobiliários, na redação anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 357-A/2007, de 31/10, há que se reconhecer que o referido Decreto Lei nº 357-A/2007, de 31/10 não introduziu, neste particular, nenhuma alteração que invalide a aplicação do argumentário da jurisprudência uniforme, que assim deve ser seguida. Para determinação da ilicitude por violação do dever de informação do intermediário financeiro, o que incumbe provar ao cliente/lesado é a violação objetiva do dever de informação, ou seja, a omissão de informações relevantes para a tomada de decisão ou prestação de informação falsa. Ao intermediário financeiro cabe a prova de que a informação que prestou revestia as qualidades necessárias (completa, verdadeira, atual, clara, objetiva e lícita, proporcional). Tratando-se de uma regra geral aplicável a todos os deveres do intermediário financeiro, o princípio da proporcionalidade inversa, previsto no artigo 312º nº 2 do CVM, é aplicável em função dos concretos factos apurados e independentemente da concreta relação contratual estabelecida, não se confundindo com o dever de adequação em sentido estrito. Não podemos considerar o dever de informação do intermediário financeiro cumprido apenas com base na existência de cláusulas contratuais e declarações padronizadas, cujo ónus de comunicação efetiva cabe ao intermediário financeiro, nos termos dos artigos 321º, nº3, do CVM e 5º, nº3, do DL nº 446/85, de 25/10, havendo que apreciar, em concreto, se foi efetivamente cumprido o dever de informação. A comunicação da informação tem que ser adaptada ao cliente em concreto, aos seus conhecimentos e experiência: no preenchimento do artigo 7º do CVM, o intérprete-aplicador deve promover um preenchimento proporcional, que atente, especialmente, à natureza dos clientes, aos serviços prestados, aos instrumentos financeiros envolvidos, à complexidade da operação, aos riscos associados e aos meios de comunicação empregues. Conjugando o perfil do cliente apurado, de avançada idade, baixa escolaridade e grande iliteracia financeira, a relação de confiança com o intermediário financeiro e as motivações do investimento, de preservação das poupanças resultantes de toda uma vida de trabalho, resulta que este cliente em concreto tomaria a afirmação de “semelhante a um depósito a prazo”, com capital garantido, como uma afirmação literal e não apenas como uma afirmação de produto de baixo risco, como o entenderia um declaratário investidor médio. A culpa traduz-se no facto de o intermediário não ter adotado a conduta prevista na lei quando devia tê-lo feito. A qualidade profissional do banco e o perfil não qualificado do cliente refletem uma maior censurabilidade da conduta daquele ao omitir informações relevantes e ao transmitir informações falsas com vista a garantir a subscrição de determinados produtos financeiros, o que se traduz em culpa grave. A não aceitação de propostas de mitigação de um dano já integralmente consumado – a liquidação dos produtos acompanhado de uma solução comercial – não causa o dano e não contribui para o seu agravamento. Quanto muito poderia minorar o dano, mas essa (não aceitar uma proposta suscetível de diminuir um dano já integralmente produzido) não é uma conduta que esteja contemplada no nº1 do artigo 570º do CC. O ónus da prova dos factos que integram os requisitos do enriquecimento sem causa, quando invocado como exceção, cabe ao réu que os invoca. A responsabilidade emergente da execução de ordens de subscrição de valores mobiliários emitidas no quadro de um contrato de intermediação financeira que associa a conta de depósito e registo de instrumentos financeiros a uma conta à ordem solidária pode ser feita valer por apenas um dos titulares, podendo o tribunal conhecer integralmente do pedido nos termos do disposto no artigo 32º nº 2 do CPC. No caso concreto, da conjugação do perfil conservador e motivações apuradas do A. (rentabilizar o produto de uma vida de trabalho) resulta claramente uma aversão ao risco. Mas não se tendo, porém, apurado que, se o A. tivesse sido concretamente informado de que a subscrição daqueles produtos tinha risco de perda de capital, a não teria feito, não temos preenchido o elemento naturalístico do nexo de causalidade, a condição sine qua non da qual se poderia extrair, como base no globo da prova produzida, o elemento abstrato do referido nexo de causalidade».

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