(relator: Maria João Areias) O Tribunal da Relação de Coimbra vem concretizar o conceito de atividade perigosa, para efeitos do artigo 493º/2 CC. Pode ler-se no aresto que «o legislador, no nº2 do artigo 493º, recorrendo a um conceito indeterminado, não diz o que se deve entender por atividade perigosa, limitando-se a fornecer ao intérprete uma diretriz genérica para identificação das atividades perigosas. Deve tratar-se de atividade que, mercê de qualquer dessas duas razões – pela sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados –, (…) envolva uma probabilidade maior de causar danos do que a verificada nas restantes em geral. Sendo matéria a apreciar caso a caso, segundo as circunstâncias, e a título exemplificativo, têm vindo a ser consideradas perigosas, para efeitos da sua eventual aplicação, as seguintes atividades: escorregas, piscinas e pistas existentes num parque aquático; uma corrida de karting; o armazenamento e o manuseamento de resinas ou de outros materiais inflamáveis; responsabilidade da pessoa coletiva que ordenou o lançamento de um fogo-de-artifício sem necessidade da identificação do concreto agente executante; a prática desportiva “moto de água”; a condução, distribuição e entrega de energia elétrica; a organização de uma prova de veículos todo o terreno; um rally automobilístico, etc». Nessa medida, «também o caso do caçador que, no exercício da caça ou por causa dela, causa danos a terceiro, há muito vem sendo considerada como uma atividade perigosa, quer pela natureza dos meios adotados, quer pela sua própria natureza porque dela são inseparáveis esses meios, sendo precisamente um dos exemplos a que recorre habitualmente a doutrina». Daí concluir que, «se a prática individual da caça constituiu uma atividade perigosa, a organização de uma montaria – sendo um processo de caça que envolve muitas pessoas (caçadores, postores, carregadores, matilheiros e pessoal da organização) – constituiu, em si, uma fonte de perigo muito superior à que resulta da prática individual da caça, quer pelo número de caçadores e armas envolvidas quer pelo número de possíveis vítimas, aumentando exponencialmente os riscos de um acidente». Esta qualificação da atividade como perigosa permite depois ao coletivo, com apelo à teoria imputacional das esferas de risco, considerar que «o ato de organização de uma montaria gera uma esfera de riscos própria, criando um aumento do risco relativamente ao exercício individual da caça, faz surgir uma série de deveres de cuidado – de organização, de aviso, de atuação sobre o foco de perigo, deveres de seleção dos participantes, deveres de instrução e formação, deveres de vigilância e de assistência – sendo-lhe, em princípio, imputáveis todos os danos que tenham a sua raiz naquela esfera».