(Relator: Arlindo Crua) O Tribunal da Relação de Lisboa veio considerar que, «estabelecendo-se no trato preparatório (pré)contratual uma relação de confiança entre as partes, análoga à contratual, a lei impõe aos contratantes o dever de se comportarem, durante a fase preliminar contratual, com recíproca lealdade e correção, em plena observância das regas da boa fé (ética). Tutela-se, desta forma, a confiança e a expectativa criada entre as partes na fase pré-contratual, pois, o mero ato de entrarem em negociações tem respaldo na mútua confiança criada na contraparte, de forma a merecer a tutela do direito. No decurso de tal fase, normalmente lenta e de progressiva formação, desenrolam-se vários trâmites, que se traduzem, entre o mais, na formulação de propostas e contrapropostas, de eventual necessidade de consulta de técnicos e estudos da área específica, múltiplas reuniões, avanços e recuos – fase negociatória -, que culminam normalmente em proposta e aceitação definitivas – fase decisória -, pelo que não pode aludir-se a uma situação de epílogo contratual sem que as partes tenham acordado em todas as cláusulas sobre as quais qualquer delas tenha julgado necessário o acordo. Por princípio, no âmbito das negociações preliminares de um contrato, as partes podem desistir livremente do mesmo, enquanto não for concluído, assim exercendo o princípio da liberdade contratual inscrito no artigo 405º, do Código Civil. Todavia, tais negociações com vista a obter um acordo negocial, determinam para os contratantes, por si só, a sujeição aos enunciados deveres, pelo que, caso a parte desistente do contrato infrinja, com tal atitude, a boa fé objetiva exigível, incorre na culpa in contrahendo. A responsabilidade do desistente faltoso fá-lo-á incorrer, em rega, em indemnizar a contraparte pelo interesse negativo ou de confiança – colocando-a na situação em que se encontraria se o negócio não se tivesse efetuado (ou se não tivessem ocorrido as suas fases preliminar ou formativa) -, podendo, de forma excecional, a sua responsabilidade abranger o interesse positivo ou de cumprimento, nomeadamente nas situações de violação do dever de conclusão do negócio. Admitindo-se, em ambas as situações, a indemnizibilidade quer dos danos emergentes, quer dos lucros cessantes, sendo que estes, no âmbito do interesse contratual negativo reportam-se, normalmente, à perda de oportunidades de negócio. Assim, na fase antecedente à outorga de um contrato e início da produção dos respectivos efeitos obrigacionais, as partes estão sujeitas a observar deveres acessórios ou laterais de conduta, impostos pelo dever geral de boa fé que as vincula. Entre as obrigações pré-contratuais a que as partes contratantes estão vinculadas podemos enunciar a obrigação de informação, a obrigação de proteção e a obrigação de lealdade (no âmbito da qual são ainda distinguíveis os deveres de sigilo, de cuidado e de atuação consequente), definindo-se esta como a obrigação de respeitar a contraparte contratante, sem coação ou aproveitamento da sua debilidade, e da qual decorre o dever de não romper, de forma injustificada, inesperada e arbitrária, as negociações, especialmente quando estas atingiram um estádio avançado de maturidade e a contraparte já adquirira plena confiança na conclusão do negócio. Com efeito, se no decurso das negociações uma das partes, com o comportamento adoptado, incute na demais confiança razoável de que o contrato em negociação será concluído e, posteriormente, sem justificado motivo, interrompe as negociações e nega-se à sua conclusão, fica onerada a reparar os danos causados à outra parte contratante por tal ruptura, pois, sendo livre a possibilidade de não concluir o contrato, não é a mesma arbitrária. Tal confiança na conclusão do contrato incutida à outra parte deve fundar-se em dados concretos e inequívocos, tendo por base critérios de senso comum ou de prática corrente. Configurando-se, deste modo, como efetivos requisitos ou pressupostos da obrigação de indemnização: a criação daquela razoável confiança na conclusão do contrato em negociação; a natureza injustificada ou arbitrária da ruptura das negociações ou conversações; a ocorrência de um dano (prejuízos) no património da parte não desistente; a relação causal entre estes prejuízos e a confiança suscitada. Na presente forma de responsabilidade, o ilícito traduz-se no efetivo não cumprimento culposo de uma obrigação pré-contratual, ao qual se tem que aditar, para o preenchimento do normativo legal responsabilizante, a culpa (eventualmente presumida), o dano e o nexo causal entre o ato (ou a omissão) e o dano ou prejuízos. Porém, para que a ruptura se configure como ato ilícito, é mister demonstrar-se que a parte que interrompeu a negociação agiu de forma reprovável e violadora da boa fé, ou seja, a ruptura só deve ser considerada ato ilícito se existiu má fé da parte que não quis consumar o contrato, agindo fora dos quadros da seriedade e honestidade, em desconsideração de um relacionamento sério e isento na contratação. Na situação de responsabilidade pré-contratual pela injustificada ruptura das negociações, a temporal sujeição aos deveres pré-contratuais é de casuística determinação, dependendo, nomeadamente, da duração do período negocial, da fase atingida no desenvolvimento das negociações, na eventual existência de antecedente relacionamento contratual entre as partes, da tipologia contratual em equação e da eventual natureza profissional de um ou de ambos os contratantes, discutindo-se, quanto à qualificação da natureza de tal responsabilidade pré-contratual, se estamos perante responsabilidade contratual ou, antes, perante responsabilidade extracontratual, admitindo ainda alguns autores, em alternativa, estarmos perante uma denominada terceira via da responsabilidade civil».

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