(Relator: Pimentel Marcos) O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que, «no nº 2 do artigo 493º do Código Civil, segundo o qual “quem causar danos a outrem no exercício de uma atividade, perigosa por sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados, é obrigado a repará-los, exceto se mostrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir”, estabelece-se a inversão do ónus da prova (uma presunção de culpa na produção dos danos causados por alguém no exercício de uma atividade perigosa). O legislador parte do princípio de que, dadas as circunstâncias do caso, o lesante deve ser responsabilizado pelas consequências resultantes do exercício dessa atividade, permitindo-lhe, contudo, que possa ilidir essa presunção, mostrando que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias para prevenir os danos. Uma atividade deve ser considerada perigosa, para os efeitos do nº 2 do artigo 493º do Código Civil, quando, mercê da sua natureza ou da natureza dos meios utilizados, tenha ínsita, ou envolva, uma probabilidade de causar mais danos do que a verificada na generalidade das restantes atividades. Ou, dito doutro modo: será atividade perigosa aquela que, face às circunstâncias envolventes, implica para outrem uma situação de perigo agravado de dano face à normalidade das coisas, pelo que a sua perigosidade concreta deve ser apreciada caso a caso, de acordo as referidas circunstâncias. Assim, para os efeitos do nº 2 do artigo 493º do CC, a atividade há de ser perigosa pela sua própria natureza ou pela natureza dos meios utilizados. Mas não pode considerar-se perigosa apenas porque é susceptível de causar lesões graves, uma vez que isso pode suceder, em maior ou menor grau, em qualquer atividade humana, razão pela qual deve ser aferida a priori e não em função dos resultados danosos que se venham a verificar, embora a magnitude destes possa evidenciar o grau de perigosidade da atividade, ou risco dessa atividade. Mas uma atividade não pode ser considerada perigosa, para os efeitos em causa, pelo simples facto de, com frequência, poder causar danos graves. É ainda necessário que a perigosidade seja intrínseca à própria atividade, quer pela sua própria natureza, quer pelos meios utilizados no seu exercício. O futebol, em princípio, não se reveste de uma especial perigosidade, quer pela sua própria natureza (embora haja frequentes lesões), quer porque não são utilizados meios em si especialmente perigosos. Por isso, deve considerar-se que, para os efeitos do nº 2 do artigo 493º do Código Civil, a prática do futebol não é uma atividade perigosa. Considerar-se que um jogo de futebol é uma atividade perigosa para este efeito, equivaleria a aceitar-se a responsabilidade civil objetiva, pois o Clube não tem a mínima hipótese de ilidir a presunção de culpa, sendo certo que há situações [por referência às quais], sendo consideradas atividades perigosas, o lesante pode, com maior ou menor dificuldade, ilidir a presunção. O jogador lesado num desafio de futebol sabia, ou devia saber, que, ao aceitar participar no jogo corria o risco de vir a sofrer alguma lesão (de maior ou menor gravidade), assumindo assim, voluntariamente, esse risco, e o consentimento do lesado (anterior à lesão) constitui causa justificativa desse facto nos termos do artigo 341.º do C. Civil».
