(Relatora: Maria Cristina Cerdeira) O Tribunal da Relação de Guimarães veio considerar que «a compensação do dano biológico tem como base e fundamento a perda ou diminuição de capacidades funcionais que, mesmo não importando perda ou redução da capacidade para o exercício profissional da atividade habitual do lesado, impliquem ainda assim um maior esforço no exercício dessa atividade e/ou a supressão ou restrição de outras oportunidades profissionais ou de índole pessoal, no decurso do tempo de vida expectável, mesmo fora do quadro da sua profissão habitual. O dano biológico, perspetivado como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com substancial e notória repercussão na vida pessoal e profissional de quem o sofre, é sempre ressarcível, como dano autónomo, independentemente do seu específico e concreto enquadramento nas categorias normativas do dano patrimonial ou do dano não patrimonial. A indemnização a arbitrar pelo dano biológico sofrido pelo lesado consubstanciado em limitações funcionais relevantes e algumas sequelas físicas deverá compensá-lo – para além da presumida perda de rendimentos, associada àquele grau de incapacidade permanente – também da inerente perda de capacidades, mesmo que esta não esteja imediata e totalmente refletida no nível de rendimento auferido. A indemnização pelo dano biológico deve ser fixada com recurso à equidade nos termos do artigo 566º, nº. 3 do Código Civil, em função dos seguintes fatores: idade do lesado e expectativa de vida, grau de incapacidade geral permanente, potencialidades de aumento de ganho na sua profissão ou em profissão alternativa aferidas em regra pelas suas qualificações, devendo o julgador ter igualmente em consideração as decisões judiciais que fixem indemnizações em situações similares com vista a uma interpretação e aplicação uniformes do direito. No que diz respeito ao dano biológico referente à perda ou diminuição da capacidade para o trabalho e, mais genericamente, ao dano patrimonial futuro, a justa indemnização deve corresponder a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir e que se extinguirá no final do período provável da sua vida, devendo, por isso, ser calculada com referência ao tempo provável de vida do lesado (normalmente através da referência à esperança média de vida), e não com base na idade da reforma, posto que só assim se logrará reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação. Tendo o lesado, à data do acidente, 34 anos de idade, ficado a padecer de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 5 pontos, sendo as sequelas em termos de repercussão permanente na atividade profissional compatíveis com o exercício da sua atividade habitual, mas implicando esforços suplementares e que, no futuro, necessitará de medicação analgésica a prescrever por médico assistente e de sessões de fisioterapia a prescrever por médico fisiatra, em duas consultas anuais, considera-se justa e equitativa a quantia de € 38.000,00 a título de dano biológico. A indemnização por danos não patrimoniais, mais que ressarcir um dano, visa compensar o lesado com uma quantia pecuniária que represente um lenitivo que contrabalance as dores físicas e morais sofridas, insusceptíveis de avaliação pecuniária; ou seja, não podendo a indemnização anular o mal causado, destina-se a proporcionar uma compensação moral pelo prejuízo sofrido. Embora a lei não defina quais são os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, tem sido entendido unanimemente pela doutrina e jurisprudência que integram tal ideia as dores e padecimentos físicos e morais, angústia e ansiedade produzidas pela situação de alguém que sofreu um acidente e as lesões decorrentes, os danos resultantes de desvalorização, deformidades, além do sofrimento atual e sentido durante o tempo de incapacidade, a angústia acerca da incerteza e futuro da situação e a existência e grau de incapacidade sofridos, sendo de valorar, também, a circunstância de a vítima ter sofrido períodos de doença significativos, com prolongados internamentos hospitalares, períodos de imobilização e intervenções cirúrgicas, dificuldades de locomoção e de condução, além das restrições pessoais e sociais daí decorrentes. No que se refere ao juízo de equidade, não deve confundir-se a equidade com a pura arbitrariedade ou com a total entrega da solução a critérios assentes em puro subjetivismo do julgador, devendo a mesma traduzir a justiça do caso concreto, flexível, humana, independente de critérios normativos fixados na lei, devendo o julgador ter em conta as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida. No caso da indemnização por danos não patrimoniais, para além de se atender à equidade, não se deverá, ainda, desconsiderar, que a fixação do quantum indemnizatório deve orientar-se em harmonia com os padrões de cálculo adoptados pela jurisprudência mais recente, de modo a salvaguardar as exigências de igualdade no tratamento do caso análogo, uniformizando critérios, o que não é incompatível com o exame das circunstâncias de cada caso. Mostra-se adequada a indemnização atribuída ao lesado que sofreu acidente de viação para o qual não contribuiu, a título de danos não patrimoniais, no montante de 10.000,00, que na sequência do embate sofreu lombalgia pós-traumática, consultou um médico ortopedista, se submeteu a uma ressonância magnética da coluna lombo-sagrada, sofreu os períodos de défice funcional temporário total de 1 dia, de défice funcional temporário parcial de 31 dias e de repercussão temporária na atividade profissional total de 32 dias, ficou com sequelas decorrentes da lesão causada pelo embate que determinaram um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 5 pontos, compatível com o exercício da sua atividade profissional, mas que implica esforços suplementares, com um quantum doloris de grau 3 numa escala de 1 a 7, uma repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer fixada no grau 3 e uma repercussão permanente na atividade sexual fixada no grau 2, que no futuro necessitará de medicação analgésica a prescrever por médico assistente e de sessões de fisioterapia a prescrever por médico fisiatra, em duas consultas anuais e que após o embate se tornou uma pessoa mais triste, irritando-se facilmente com os seus familiares em virtude das dores de que padece».

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