(Relator: José Capacete) O Tribunal da Relação de Lisboa veio considerar que «o limite da condenação, tanto quantitativa, como qualitativamente, deve ser reportado ao pedido global, nada obstando, por isso, a que, se esse pedido representar a soma de várias parcelas, que não correspondam a pedidos autónomos, como acontece, regra geral, nas ações de indemnização por acidente de viação, se possa valorar cada uma dessas parcelas, em quantia superior à referida pelo autor, desde que o cômputo global fixado na sentença não exceda o valor total do pedido. Só no caso de inexistência de danos emergentes ou de lucros cessantes se deve abordar a questão do dano autónomo (autónomo, relativamente àquelas duas modalidades de dano patrimonial) de privação de uso da viatura, sendo que só quanto a este dano autónomo faz sentido equacionar a questão de saber se a simples privação do uso do veículo não será, de per se, suscetível de originar prejuízos que mereçam a tutela do direito. Será o caso, por exemplo, de um determinado lesado não ter sofrido qualquer um daqueles danos (danos emergentes e lucros cessantes) mas ter apenas ficado na impossibilidade de utilizar o veículo nas suas deslocações normais, como simples meio de transporte para o local de trabalho, ou em passeios de família, recorrendo a boleias de colegas ou de outra viatura cedida por familiares ou amigos. E esse dano autónomo de privação da viatura é um dano patrimonial. Sendo o termo inicial do cômputo da indemnização pela privação do uso do veículo, a data do acidente, o termo final, mesmo no caso de perda total do veículo sinistrado, coincide com a data em que é colocada à disposição do lesado a indemnização destinada ao ressarcimento dessa perda total ou, não sendo este o caso, na data em que é disponibilizada a indemnização para reparação do veículo, a que acresce o tempo necessário para a efetivação dessa reparação, pois só nessas datas o lesado fica em condições de substituir o veículo sinistrado ou de o usar depois de reparado. O valor da indemnização pela perda total de um veículo em consequência de acidente de viação é o correspondente ao valor venal do veículo antes do sinistro» e que «o dano biológico constitui um dano-evento, reportado a toda a violação da integridade físico-psíquica da pessoa com tradução médico-legal, ou como diminuição somático-psíquica e funcional do lesado, com repercussão na sua vida pessoal e profissional, independentemente de dele decorrer ou não perda ou diminuição de proventos laborais. O responsável pelo dano biológico, porque incidente sobre o valor humano, em toda a sua dimensão, em que o bem saúde é objeto de um autónomo direito básico absoluto, deve repará-lo, em qualquer caso, mesmo que se não prove uma efetiva redução do vencimento do lesado como causa e efeito de um tal dano. O que releva, ante a comprovação de um tal dano, é a repercussão negativa desse défice, centrado na diminuição da condição física, da resistência e da capacidade de realizar esforços por parte do lesado, o que, necessariamente, se traduzirá numa deficiente ou imperfeita capacidade de utilização do corpo no desempenho das atividades pessoais em geral e numa consequente e, obviamente, de igual modo previsível, maior penosidade na execução das suas diversas tarefas, tudo significando um maior dispêndio de energias, um maior desgaste físico na execução das mesmas, comparativamente com o que sucedia antes do acidente».

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