(Relator: Luís Filipe Sousa) O Tribunal da Relação de Lisboa veio considerar que «a publicação pela Wikipédia de biografia em linha do requerente integra o tratamento de dados pessoais deste. Todavia, o Regulamento (UE) 2016/679 (Regulamento Geral de Proteção de Dados) não se aplica ao caso em apreço porquanto não se verifica nenhum dos requisitos alternativos previstos no artigo 3.º do Regulamento (âmbito de aplicação territorial). No âmbito de um procedimento cautelar em que a decisão aí a tomar já não possa ser objeto de um recurso, a formulação de reenvio prejudicial não é obrigatória, desde que seja possível a cada uma das partes propor ou exigir a propositura de uma ação principal, no decurso da qual a questão – provisoriamente resolvida no processo de natureza sumária – possa ser reapreciada quanto ao seu mérito substantivo e ser objeto de um reenvio prejudicial (Acórdãos do Tribunal de Justiça de 24.5.1977, Hoffman – La Roche, 107/76, e de 27.10.1982, Caso Morson, C-35/82). O respeito pela vida privada e familiar (artigo 7.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia-CDFUE) tem o mesmo sentido e alcance que o sentido e o alcance conferidos ao artigo 8.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos Humanos-CEDH, conforme interpretado pela jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos-TEDH. A liberdade de expressão e de informação (artigo 11.º da CDFUE) tem o mesmo sentido e alcance que o sentido e o alcance conferidos ao artigo 10.º da CEDH, conforme interpretado pela jurisprudência do TEDH. Dado o importante papel desempenhado pela internet em aumentar o acesso do público a notícias e a facilitar a disseminação de informação, a função dos bloggers e dos utilizadores das redes sociais pode também ser assimilada à de “cães de guarda públicos”, para efeitos da proteção conferida pelo artigo 10.º da CEDH. Quando a pessoa em causa desempenha um papel na vida pública, essa pessoa deve demonstrar um grau de tolerância acrescido, dado que está inevitavelmente e com pleno conhecimento disso exposta ao escrutínio público. A fim de evitar impor a essa pessoa um ónus excessivo suscetível de prejudicar o efeito útil do direito à supressão de referências, cabe-lhe unicamente fornecer os elementos de prova que, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, lhe possam razoavelmente ser exigidos que procure para demonstrar essa inexatidão manifesta. Justifica-se o acionamento do direito ao esquecimento do requerente num contexto em que: a. este terá alegadamente praticado, em 1989, factos que sustentaram posteriormente uma acusação do Ministério Público pela prática de um crime de furto qualificado; b. não chegou a ocorrer julgamento; c. nada consta provado nos autos no sentido de que, a terem ocorrido tais factos, os mesmos tenham gerado um alarme social relevante, quer a nível local quer a nível nacional, ou seja, não está demonstrada a existência de um incontroverso interesse público original; d. a ter ocorrido a prática de tal crime, o procedimento criminal respetivo está prescrito, pelo menos desde 2008; e. não é divisável um interesse público atual sobre a aferição da ocorrência de tais factos em 1989, tanto mais que as biografias em linha não indicam a prática posterior de factos similares pelo requerente, nem está demonstrado que, à data da interposição do procedimento, o requerente alimente a pretensão de exercer novos cargos públicos, v.g. cônsul. Ao desejar ter intervenção política, o requerente suscita, naturalmente, o interesse do público/internautas, sendo certo que qualquer intervenção política dá azo a um debate com interesse público sobre a idoneidade e mérito dos ideais políticos que são por si assumidos (expressa ou implicitamente). A intervenção pública em eventos políticos, qualquer que seja o seu grau, é, por natureza, um ato da esfera pública, sendo o propósito da atividade política o de transformação da sociedade e, por isso mesmo, qualquer atividade deste tipo está sujeita a escrutínio público. São admissíveis as manifestações anónimas como parte do direito à liberdade de expressão, considerando-se que a proteção do anonimato decorre do princípio da autodeterminação informacional. Todavia, esse direito – como em qualquer situação de conflito ou colisão – cede perante outros direitos ou outros bens constitucionalmente protegidos, nomeadamente em caso de ilicitude. A Wikipedia não é um prestador intermediário de serviços para efeitos de isenção de uma obrigação geral de vigilância sobre as informações que difunde (cf. artigos 12.º a 15.º da Diretiva 2000/31/CE e artigos 4.º, n.º 5, e 12.º do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de Janeiro)».

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