(Relatora: Laurinda Gemas) O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que «um advogado arrolado como testemunha deve recusar prestar o seu depoimento, no cumprimento do dever de sigilo profissional imposto pelo artigo 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados, se os factos sobre os quais o mesmo é pretendido constituírem violação do dever profissional de sigilo (cf. artigo 497.º, n.º 3, do CPC). O depoimento de advogado prestado sobre factos abrangidos pelo sigilo profissional constitui prova obtida com violação do dever de segredo profissional, tratando-se, por tal razão, de prova materialmente proibida e, por isso, ilícita, não podendo fazer prova em juízo (artigo 92.º, n.º 5, do EOA). A ofensa de tal dever fará incorrer o advogado em responsabilidade disciplinar, civil e criminal (cf. artigo 92.º do EOA). Tendo o Tribunal de 1.ª instância atendido, na formação da sua convicção, ao depoimento prestado por testemunha (arrolada pelo Réu) que é advogado e patrocinou o ora Autor no processo disciplinar que culminou com a demissão deste, afirmando-se na sentença que um tal dever não tenha sido infringido, mas não pretendendo o Autor, no recurso que interpôs da sentença, impugnar a decisão da matéria de facto, limitando-se a defender a inadmissibilidade de tal depoimento, não cumpre ouvir a gravação do depoimento para verificar se uma tal violação terá ocorrido. Não havendo que reapreciar a prova produzida em ordem a sindicar um qualquer erro de julgamento de facto, mostra-se inútil conhecer da questão suscitada pelo Apelante, estando mesmo vedado fazê-lo, por força do princípio da limitação dos atos – cf. artigo 130.º do CPC. Provando-se que (i) o Autor, que era funcionário público e tinha sido demitido, contactou o Advogado, ora Réu, no então escritório deste, para lhe prestar serviços de advocacia, designadamente para avaliar da viabilidade da impugnação da decisão de demissão, que (ii) o advogado que representou o Autor no dito processo disciplinar lhe havia comunicado que não iria propor ação para impugnação da sua demissão por entender que não havia fundamento para tal e que essa ação não teria viabilidade, e que (iii) o Réu aceitou apreciar o assunto, mas não se tendo provado que o serviço de advocacia era propor uma ação administrativa para impugnação de demissão, é de considerar que tal contrato de prestação de serviços de advocacia se reportava à figura da consulta jurídica (cf. artigo 68.º do EOA e artigo 3.º da Lei n.º 49/2004), sem prejuízo de poder vir a ser acordado ulteriormente um mandato judicial. Ao apreciar da responsabilidade civil profissional, no caso de advogado, haverá, primeiro, que começar por indagar da verificação de todos os pressupostos da responsabilidade civil, incluindo o nexo de causalidade adequada e os danos concretos, que podem ser de natureza não patrimonial ou patrimonial, em que se justifica considerar o dano da perda de chance, quando não se mostre possível compensar o lesado pelo “dano final”, sendo aquele perspetivado como uma afetação relevante (“consistente” e “séria” – cf. AUJ do STJ n.º 2/2022) de posição jurídica tutelada pelo Direito ou violação de direito que integra a esfera jurídica do lesado (v.g. a perda do direito de ação, a perda do direito ao recurso, a perda do direito à prova); depois, se estiverem verificados tais pressupostos, há que passar à quantificação dos danos, determinando-se o valor da respetiva indemnização. No caso dos autos, é de concluir que o contrato em apreço foi culposamente incumprido pelo Réu (cf. artigo 799.º do CC), considerando que, não só não logrou provar ter realizado o serviço a que se propôs em abril de 2014, como ficou provado que, em novembro de 2017, devolveu ao Autor os documentos que ele lhe entregara e a quantia paga a título de provisão. Com efeito, não tendo sido alegado que o contrato foi celebrado pro bono, e atendendo a que o Réu é advogado de profissão, não pode deixar de ser considerado um contrato oneroso (cf. artigos 1154.º a 1158.º do CC), pelo que a devolução integral da quantia paga a título de provisão, volvidos mais de 3 anos, constitui um comportamento concludente e revelador de que não foi realizado por aquele um qualquer “ato de advogado” que devesse ser remunerado. Improcede a pretensão de indemnização a título de danos morais se, como sucedeu no caso em apreço, não obstante este incumprimento por parte do Réu de tais deveres, violando a confiança que o Autor nele depositou, não resultaram provados quaisquer factos atinentes aos invocados danos não patrimoniais; ao invés, foram considerados não provados os factos alegados a esse respeito, designadamente que, ao aperceber-se de que o Ré não tinha proposto a referida ação, o Autor ficou desolado, triste e revoltado, e se sentiu enganado e enxovalhado. Já quanto aos danos patrimoniais invocados, não poderá, no caso dos autos, deixar de ser convocada a doutrina da perda de chance, considerando designadamente que numa ação de impugnação de demissão era à “Administração” (Secretaria Regional dos Recursos Naturais da Região Autónoma dos Açores) que incumbia o ónus de alegar e provar os factos atinentes ao conceito indeterminado da inviabilidade da manutenção da relação funcional. Tendo o Autor alegado, na nova Petição Inicial aperfeiçoada, um conjunto de factos em ordem a demonstrar precisamente a viabilidade de uma tal ação e assim dar consistência e seriedade ao dano da perda de chance em apreço, face ao ónus da prova que impendia sobre ele, mas não resultando provados tais factos, nada se tendo provado quanto às alegações de facto e de direito da petição da ação que o Autor pretendia intentar para impugnar a sua demissão, não se mostra possível formular um juízo técnico no sentido da provável viabilidade dessa ação, não estando demonstrado o dano da perda de chance, inexistindo fundamento para atribuir ao Autor a indemnização que peticionou a título de “danos materiais”».