(Relator: Oliveira Abreu) O Supremo Tribunal de Justiça veio considerar que, «estando em causa a responsabilização solidária dos demandados, enquanto responsabilidade civil por atos médicos, um enquanto Hospital, e outro enquanto médico da demandante e autor da operação cirúrgica que alegadamente veio a desencadear os danos físico-emocionais, importa ter pressente que estas situações encerram relações jurídicas que envolve o contrato de prestação de serviços médicos privados, tipologia cuja natureza se pode distinguir em um dos seguintes termos: (i) contrato total, que é “um contrato misto (combinado) que engloba um contrato de prestação de serviços médicos, a que se junta um contrato de internamento (prestação de serviço médico e paramédico), bem como um contrato de locação e eventualmente de compra e venda (fornecimento de medicamentos) e ainda de empreitada (confeção de alimentos)”; (ii) contrato total com escolha de médico (contrato médico adicional), que corresponde a “um contrato total mas com a especificidade de haver um contrato médico adicional (relativo a determinadas prestações)”; (iii) contrato dividido, que é aquele em que “a clínica apenas assume as obrigações decorrentes do internamento (hospedagem, cuidados paramédicos, etc.), enquanto o serviço médico é direta e autonomamente celebrado por um médico (atos médicos).” Saber se houve cumprimento defeituoso dos contratos de prestação de serviços médico-cirúrgicos, responsabilidade civil por atos médicos, importa reconhecermos estar em causa uma situação de concurso de responsabilidade civil contratual e extracontratual, sendo que a orientação consolidada neste Supremo Tribunal de Justiça vai no sentido da opção pelo regime da responsabilidade contratual por ser mais conforme ao princípio geral da autonomia privada e por ser, em regra, mais favorável ao lesado. Indagar a responsabilidade contratual quanto à execução da obrigação por parte do profissional médico é sindicar a falta de realização integral da prestação devida, ou a sua realização defeituosa, conquanto se tenha generalizado que não seja típico das intervenções médicas com funções de cura ou melhoria do estado de saúde a obrigação de resultado, antes precipitam-se em obrigação ou obrigações de meios para a realização do tratamento ou intervenção adequados. Estamos perante um erro médico na consecução dessa obrigação de meios desde que o ato da competência funcional de um profissional de medicina se revele descaracterizado e desadequado aos fins que a ciência e a arte da medicina injungiam para a debelação ou minoração de um padecimento previamente diagnosticado e reconhecido pela cognoscibilidade da ciência médica. A responsabilidade médica por violação das leges artis tem lugar quando, por indesculpável falta de cuidado, o médico deixe de aplicar os conhecimentos científicos e os procedimentos técnicos que, razoavelmente, face à sua formação e qualificação profissional, lhe eram de exigir, ou seja, a violação do dever de cuidado pelo médico traduz-se precisamente na preterição das leges artis em matéria de execução da sua intervenção. Só com a violação do dever de cuidado, avaliado em função de um padrão médio de comportamento, mediatizado pelas legis artis, é que, independentemente das consequências, mais ou menos graves, para o doente, e numa análise neutra a posteriori, teremos um erro juridicamente relevante, base para um ilícito de natureza pessoal e uma responsabilidade subjetiva, enquanto pressuposto primeiro da responsabilidade civil por atos médicos. Em sede de distribuição do ónus da prova perante obrigações de meios, incumbe ao doente-paciente lesado, na qualidade de credor, provar a falta de cumprimento do referido dever objetivo de cuidado na atuação técnica como fundamento de ilicitude na responsabilidade contratual médica (artigo 342º n.º 1 do Código Civil.), nele incluindo a obrigação omissiva de não afetar a sua integridade física e saúde.

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