(Relator: João Rato) O Supremo Tribunal de Justiça veio considerar que, «não tendo a indemnização […] em apreço, atendendo à natureza dos danos em causa, imateriais e insuscetíveis de tradução pecuniária, a finalidade de reconstituir o ofendido na situação em que se encontrava antes do ato lesivo dos seus direitos – reconstituição natural – ou sequer a de, nessa impossibilidade ou excessiva onerosidade do devedor, os indemnizar segundo os princípios da equivalência e da diferença, nos termos dos artigos 562º e ss. do CC, deve a mesma ser fixada segundo um juízo de equidade, nos termos do artigo 496º, por referência e consideração das circunstâncias referidas no artigo 494º, ou seja, “o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso o justifiquem”, deste modo se acautelando a arbitrariedade ou mesmo discricionariedade mais ou menos subjetiva do juízo prudencial do tribunal. No caso em apreço é muito elevado o grau de culpabilidade do recorrente, que atuou com intenso dolo direto, sendo as demais circunstâncias do caso `reveladoras de uma atuação calculista, violenta e de indiferença perante o sofrimento da assistente ofendida, sem manifestação de qualquer sinal de arrependimento ou de vontade reparadora do mal que lhe infligiu e das muito nefastas, profundas e vitalícias consequências dele resultantes para a sua saúde e bem-estar físico e psíquico, autoestima, realização pessoal e profissional, capacidade e gosto pela vida e relacionamento social, indo ao extremo de lhe provocar ideação suicida e de a tornar dependente de permanente acompanhamento psicológico e psiquiátrico. Pelo que se considera ajustado, não especulativo e naturalmente aquém dos gravíssimos danos não patrimoniais sofridos pela ofendida e assistente, o valor indemnizatório de € 50.000,00 (cinquenta mil euros) fixado no acórdão recorrido, não havendo necessidade, nem justificação para qualquer intervenção corretiva deste STJ, tanto mais que, ao contrário do alegado pelo recorrente, essa importância se compagina e compreende dentro da sua habitual bitola para casos similares, ressalvadas as naturais especificidades de cada caso. Nem a circunstância de o arguido e recorrente não ter atualmente quaisquer rendimentos ou projeto de emprego futuro, nomeadamente em função e após o termo da situação de reclusão em que se encontra, pode obstar à sua condenação no pagamento de uma indemnização a favor da vítima ofendida, como o próprio reconhece, embora propondo um valor que, considerando aquelas outras circunstâncias, se afigura marcadamente “miserabilista” e à revelia da avaliação atualista da importância dos bens jurídicos violados e mesmo do valor do dinheiro necessário e capaz de compensar efetivamente os danos não patrimoniais por esta sofridos, tendo em atenção a sua constante erosão, em razão da inflação e da normal desvalorização monetária. Com efeito, se por um lado, não se devem fixar valores indemnizatórios inflacionados e suscetíveis de poder ser encarados quase como um enriquecimento sem causa e conducentes à ruína e indigência económico-financeira do obrigado, também não é próprio fixá-la em níveis meramente simbólicos e que não se traduzam em verdadeiro sacrifício do lesante, atendendo à natureza também reconhecidamente sancionatória, e não meramente compensatória, deste dever de indemnizar as vítimas de crimes por parte dos respetivos agentes, devendo nessa busca de equilíbrio, é dizer da equidade legalmente reclamada, dar prevalência aos bens jurídicos violados e à medida dos danos sofridos pela vítima, desde que, num juízo prospetivo se possa antever que o arguido obrigado tem condições para, em liberdade, sem pôr em causa a sua própria sobrevivência, satisfazer a obrigação indemnizatória em que tiver sido condenado, como ocorre neste caso».