(Relatora: Maria Clara Sottomayor) O Supremo Tribunal de Justiça veio considerar que, «tendo a Autora contratado com a Ré o fornecimento de uma linha de produção de tubo corrugado, incluindo a montagem da respetiva maquinaria em Moçambique, a prestação da Ré cumprir-se-ia quando tivesse colocado a linha de produção a produzir tubo corrugado (artigo 762.º, n.º 1, do Código Civil). Tendo a ré abandonado as instalações da autora, sem que a linha de montagem estivesse apta a produzir o tubo corrugado, verifica-se uma situação de mora da devedora, que, como ilícito obrigacional, se presume culposo, competindo à ré produzir prova com vista a demonstrar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua. A mora converte-se em incumprimento definitivo quando, durante a mora, o credor concede ao devedor um prazo suplementar final razoável para cumprir (interpelação admonitória) e este, mesmo assim, não cumpre (artigo 808.º, n.º 1, 2.ª parte). O conceito de prazo razoável tem uma natureza indeterminada, que carece de preenchimento valorativo à luz das circunstâncias do caso, sendo razoável o prazo suplementar suficiente para que o devedor possa completar uma prestação já iniciada. Sendo de 12 dias o prazo fixado pela autora na declaração admonitória, enviada e rececionada em 3 de setembro, deve entender-se que não é razoável ou adequado, estando em causa o cumprimento de um contrato nas instalações da autora, em Moçambique, bem como necessidades legais e sanitárias para a viagem dos funcionários da ré e transporte marítimo de materiais. A regra doutrinal e jurisprudencial segundo a qual a desrazoabilidade do prazo determina a ineficácia da declaração de interpelação do devedor produz consequências injustas, “ao protegerem desproporcionada e excessivamente os interesses do devedor e ao desprotegerem desproporcionada ou excessivamente os interesses do credor”. Assim, considera-se que a fixação de um prazo suplementar desrazoável não torna ineficaz a interpelação admonitória, fazendo com que comece a correr um novo prazo adequado ou razoável, podendo o credor que fixou um prazo desrazoável exercer o direito subjetivo à indemnização substitutiva da prestação, nos termos do n.º 1 do artigo 801.º do Código Civil, ou o direito potestativo de resolução do contrato, desde que o faça depois de decorrido um prazo razoável. A liquidação do contrato como efeito da sua extinção deve ter em conta o princípio da justiça comutativa, no sentido de se manter, relativamente às obrigações de restituição, a mesma correspetividade que as partes procuraram entre as prestações realizadas em execução do negócio inválido ou resolvido».