(Relator: José Rainho) O Supremo Tribunal de Justiça veio considerar que «a desconsideração da personalidade coletiva da sociedade significa uma derrogação do princípio legal da separação de esferas jurídico-patrimoniais, visando-se com ela uma correção das consequências jurídicas da imputação à sociedade, segundo as regras gerais, de certos atos que, pelo seu caráter abusivo ou pela sua finalidade extra-societária, se entende que devem obrigar outras pessoas (outros patrimónios). A desconsideração só pode admitir-se a título excecional, sob pena de se esvaziar de conteúdo o instituto da personalidade coletiva e cair em situações que envolveriam a sua negação. Tendo sido clausulado, em contrato de constituição de penhor de créditos, que quem o constituiu estava impedido da disposição dos créditos, é ineficaz relativamente ao credor pignoratício a cessão desses créditos a terceiro, que conhecia aquela proibição, sendo por isso inoperante a compensação de créditos que o cessionário pretendeu depois opor ao credor pignoratício. A circunstância de um banco ter agido de forma irregular em vários domínios da sua atividade enquanto instituição bancária, violando obrigações contabilísticas e prudenciais, não o faz incorrer, só por si, direta e imediatamente, em responsabilidade civil perante os respetivos clientes. A providência extraordinária estabelecida pelo Banco de Portugal a um banco de dispensa temporária do cumprimento pontual de obrigações anteriormente contraídas resolve-se numa exceção dilatória de direito material, suscetível de obstar à compensação de créditos. Não é identificável uma verdadeira união intrínseca de contratos, mas sim uma relação de garantia, entre um contrato de mútuo, um contrato de gestão de carteira de títulos e um contrato de penhor sobre os créditos dessa carteira, tendo estes dois últimos em vista dar garantia ao cumprimento das obrigações que do primeiro emergiam para o mutuário. Se não se mostra que a parte desequilibrou anteriormente o complexo contratual em que se insere o direito que exerce, agindo agora como se nada houvesse causado culposamente para a situação de incumprimento que imputa à outra parte, não se pode concluir que exerce o direito de forma abusiva no figurino do chamado tu quoque».