(Relator: Rui Machado e Moura) O Tribunal da Relação de Évora veio considerar que, «não tendo resultado provado que a Ré Sociedade Agrícola tenha protagonizado a organização da caçada em que ocorreu o sinistro discutido nestes autos, e independentemente da validade ou eficácia que possua, em termos contratuais ou administrativos, o ato de cedência aos chamados do direito de exploração cinegética, nesse mesmo local, a verdade é que, para efeitos de responsabilidade civil delitual, os hipotéticos vícios daí decorrentes não podem obliterar a responsabilidade dos efetivos detentores da disponibilidade do espaço e da organização dos eventos cinegéticos, sob pena de, assim não sendo, se tutelar uma posição manifestamente contrária aos fins de proteção do próprio instituto da responsabilidade civil. Servem tais considerações, por um lado, para, desde já, se excluir a responsabilidade da Ré Sociedade Agrícola pelo sinistro ocorrido […]. Os danos não patrimoniais próprios da vítima correspondem à dor que esta terá sofrido antes de falecer, e devem ser valorados tendo em atenção o grau de sofrimento daquela, a sua duração, o maior ou menor grau de consciência da vítima sobre o seu estado e a previsão da sua morte. Na verdade, o sofrimento moral da vítima ante a iminência da morte é uma evidência e é, por si só, um facto notório, dispensado de alegação e prova, e que não pode deixar de ser valorizado em sede de indemnização por danos não patrimoniais. Porém, no caso dos autos, para além desse facto notório, o certo é que a vítima permaneceu viva durante 17 dias evidenciando grande sofrimento próprio das lesões que haviam de lhe causar a morte, pelo que entendemos como justo e equitativo em fixar tal indemnização no montante de € 10.000,00. Fazendo apelo aos critérios fixados jurisprudencialmente, importa salientar que o dano pela perda do direito à vida, direito que se encontra no cerne da existência e da personalidade jurídica, tem oscilado entre os € 50.000,00 e € 80.000,00. No caso em apreço, estamos em presença duma vítima com um futuro ainda auspicioso pela frente em termos de realização profissional e com uma vida familiar estabilizada e gratificante, pelo que, nestas circunstâncias, a sua esperança no futuro tinha necessariamente de ser grande e repleta de projetos e de gosto pela vida. Por isso, em jeito de conclusão, dizemos que nada poderá pagar o terminus duma vida mas, havendo necessidade de quantificar o dano inerente, consideramos como inteiramente justa e equitativa a compensação de € 50.000,00. “In casu”, a morte da vítima não foi um acontecimento anódino e sem significado para o seu filho e para a sua esposa, quer no presente, quer no futuro. Por um lado, a ausência da figura paternal durante todo o resto da vida do filho, aqui A. (com 24 anos na altura da morte do pai), que para sempre lamentará tal falta vendo-se extorquido da afeição e carinho do seu progenitor e, por outro, as sequelas provocadas na esposa, aqui A., pela morte do marido, que ficou privada do seu companheiro de vida, sendo certo que a vítima e mulher viviam em harmonia, formando com o filho uma família muito unida e feliz, e a sua morte causou aos AA. enorme desgosto, choque e sofrimento. Deste modo, a não ser por mera insensibilidade a valores fundamentais da natureza humana, não podemos olvidar, de todo, as profundas consequências que a morte da vítima produziu e produzirá na vivência afetiva e emocional dos AA, pelo que entendemos que os montantes indemnizatórios relativos aos danos não patrimoniais sofridos, quer pela A., quer pelo A., devem ser fixados, respetivamente, nos valores de € 20.000,00 (para a atual viúva) e de € 12.500,00 (para o filho)».
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